É de conhecimento de qualquer estudante de Direito que o contraditório, principalmente no Processo Penal, é um dos princípios de maior relevo, consagrado no art. 5º, LV, da CF/88.
Por meio dele, assegura-se aos litigantes o direito de participação, de maneira efetiva e exauriente, no processo de formação do convencimento do magistrado. Em outras palavras, tem-se que ele traz a ideia de que as partes devem receber as mesmas condições de tratamento, buscando consolidar a famigerada paridade de armas.
E digo famigerada em razão da realidade que encontramos, nos dias de hoje, no Processo Penal, por meio na qual é possível perceber, em vários casos, que Defesa e Acusação são tratadas de maneira distinta pelos julgadores.
Para exemplificar essa assertiva, vale citar o episódio em que mensagens “vazadas” pelo “The Intecept” comprovaram que o então Juiz Sérgio Moro debatia (pelo WhatsApp) com representantes do Ministério Público (em especial com Deltan Dallagnol) quais seriam/deveriam ser as próximas “jogadas” da Acusação, buscando, ao final, a condenação dos investigados, dentre eles um ex-Presidente da República.
Agora, em um exercício imaginário, solicito aos leitores, principalmente àqueles que labutam no dia a dia forense, que pensem a seguinte situação: imagine você pedindo na Secretaria do Juízo o número pessoal do magistrado responsável para que você possa mandar uma mensagem para ele, na qual seriam discutidas possíveis estratégias defensivas… Pensou?! Difícil imaginar essa situação, não é mesmo?!
Em exemplos assim percebemos o quão longe ainda estamos de conseguir concretizar um dos mais valiosos princípios do Processo Penal: o contraditório. Chega a ser ingênuo pensar que Acusação e Defesa têm as mesmas possibilidades de participar da formação do convencimento do julgador.
E, por isso, para minimizar a grande disparidade que existe entre os litigantes, o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil elaborou, em 2018, o Provimento 188, que, apesar de ter mais de 2 anos, ainda não é muito utilizado pelos advogados, principalmente os criminalistas.
Com ele, foi regulamentada a atividade de investigação defensiva que, conforme consta no art. 1º, compreende “o complexo de atividades de natureza investigatória desenvolvido pelo advogado, com ou sem assistência de consultor técnico ou outros profissionais legalmente habilitados, em qualquer fase da persecução penal, procedimento ou grau de jurisdição, visando à obtenção de elementos de prova destinados à constituição de acervo probatório lícito, para a tutela de direitos de seu constituinte”.
Ou seja, ele buscou equilibrar as forças entre o Ministério Público e a Defesa, pois, por meio dele, ambas terão maiores condições de produzir elementos probatórios e, assim, influir no convencimento do julgador de maneira mais concreta.
Frisa-se que antes desse Provimento somente o Órgão Acusatório dispunha de instrumentos para desenvolver, livremente, provas favoráveis às suas teses, sendo o mais conhecido o Procedimento Investigatório Criminal.
Dessa forma, conclui-se, de maneira solar, que o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil foi muito feliz e competente no momento da elaboração do Provimento 188/2018, pois tentou equilibrar a já viciada balança processual.
Nesse momento, pontua-se que as regras do mencionado Provimento devem ser estudadas de maneira mais detalhada e precisa. Caso contrário, seu uso indiscriminado certamente trará complicações, sendo que aqueles que agirem de má-fé na coleta de provas podem, inclusive, incidir em ilícitos penais, tais como fraude processual e obstrução à justiça.
Para finalizar, é preciso reconhecer que estamos muito distantes de consagrar o princípio do contraditório, mas que, diante da sua explícita relevância, não podemos esmorecer e deixá-lo à deriva, motivo pelo qual devemos cobrar das autoridades responsáveis a elaboração de novas leis que busquem efetivá-lo.
Tal atitude é benéfica, até mesmo, para os magistrados, pois eles terão mais tranquilidade para proferir suas decisões. Afinal, uma decisão elaborada com base em elementos que foram amplamente debatidos pelas partes certamente tem maiores condições de alcançar a verdade processual.